segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Ordenamento jurídico e Democracia

"Maurizio Fioravanti, ao reconstruir a história do conceito de Constituição, localiza, no interior do constitucionalismo moderno, uma tensão permanente e inafastável entre a democracia e o próprio constitucionalismo ou a idéia mesma de Constituição, de governo limitado. Uma tensão permanente entre a dimensão da democracia, da soberania popular, por um lado, e, por outro, a da Constituição, dos direitos individuais, que até bem recentemente eram vistas como dimensões antagônicas, ou seja, em oposição antitética.
É fácil verificar que, de fato, quanto mais democrático é um regime político, tanto mais a vontade popular impera e, portanto, tanto menos limites constitucionais são impostos a essa vontade e a suas decisões. Por outro lado, quanto mais limites constitucionais houver, tanto mais estreita é a possibilidade de se dar livre curso a tal vontade; tanto menos campo é deixado à deliberação dos representantes da vontade popular eleitos para o exercício cotidiano da tomada de decisões.
No entanto, analisada mais profundamente essa oposição, verifica-se que essa relação não é assim tão simples. Se, por um lado, democracia e constitucionalismo efetivamente se opõem, se esses dois conceitos operam, eles próprios, efetivamente como princípios opostos, como princípios contrários, e há, de fato, uma grande tensão entre eles, por outro lado, é fundamental ter-se em conta que, ainda que contrários, não se contradizem, mas, ao invés, supõem-se mutuamente.
Ao contrário da abordagem tradicional, podemos ver agora que esses princípios são simultânea e reciprocamente constitutivos um do outro, pois instauram uma tensão rica, complexa e produtiva, sem a qual não pode haver nem democracia, nem constitucionalismo.
Aprendemos dolorosamente que a democracia só é democrática se for constitucional. A vontade ilimitada da eventual maioria é ditadura, é a negação mesma da própria idéia de democracia.
Do mesmo modo, não menos dolorosamente, aprendemos que o constitucionalismo só é constitucional se for democrático. A elaboração ou a apropriação técnico-burocrática do texto constitucional para moldar passivamente o povo como seu objeto, como objeto do Estado, como massa, é autoritarismo e, assim, a negação do próprio constitucionalismo.
É claro que, para nós, a democracia, para ser democrática, requer o respeito às regras do jogo, entendidas como o respeito ao direito das minorias. Há que ser garantida institucionalmente, portanto, a possibilidade de que a minoria de hoje venha a se tornar a maioria de amanhã. A
teoria democrática avançou até esse ponto a partir de experiências bastante dramáticas, como o nazismo, o fascismo, o stalinismo e outros movimentos autoritários.
Porém, o constitucionalismo é hoje uma garantia argumentativa contra o autoritarismo, um limite às constituições positivas vigentes."
Menelick de Carvalho Netto
"A democracia é a pior de todas as formas imagináveis de governo, com exceção de todas as demais que já se experimentaram." (Churchill apud Bonavides, 1999)

Um comentário:

  1. Mariana, seu texto me fez refletir muito, principalmente pela colocação final de Churchill, será que a democracia anda nos deixando a deriva? Parabéns...

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